Depois de se aposentar do futebol, Alemão hoje atua no serviço social. Ele é o fundador e o principal responsável pela "Casa de Transformação Betânia", na sua cidade natal, em Lavras (MG). O ex-jogador do Napoli se dedica à reabilitação de dependentes químicos, mas está sempre de olho no mundo do futebol, principalmente quando se trata do Brasil.
De quatro em quatro anos os brasileiros sonham com a Copa do Mundo..
Neste momento, em um país que também está mudando de governo, o povo brasileiro está mais distraído do que o habitual. As pessoas não acreditam tanto assim nesta equipe. As possibilidades existem, mas para mim será muito difícil o Brasil ganhar a Copa do Mundo.
O elenco, teoricamente, é muito forte...
Mas o time ainda não está maduro, é muito jovem. E falta um líder, um condutor.
Neymar não é?
Não, definitivamente não. Neymar é um grande jogador, mas não é, de forma alguma, um líder que assume o comando da equipe. Além disso, Tite vai colocá-lo atrás do atacante, onde acho que ele rende muito menos do que no lado esquerdo, onde pode ser arrasador.
Nem Thiago Silva nem Dani Alves são esses líderes para o Brasil?
Para mim, não. Líderes são outros. No meu tempo havia Sócrates, Zico, Edinho, Júnior, Dunga, Careca. Era um time muito mais sólido nesse aspecto.
Você jogou duas Copas do Mundo, em 1986 e 1990. A Seleção atual é melhor que a sua?
Com certeza melhor que a de 1990, não estávamos muito organizados. Mas aquela de 1986 foi uma grande Seleção, que só foi eliminada nas quartas de final pela França nos pênaltis. Não me parece que a atual seja melhor.
A ideia de ter Neymar e abdicar de um atacante de origem te convence?
Nem de longe. Repito: para mim, Neymar é arrasador pela esquerda, mas, se o colocarmos no meio, ele acaba pegando a bola muito atrás, afasta-se do gol e, às vezes, recebe marcação individual. Assim ele sofre muitas faltas e se torna um jogador banal, não o fenômeno que pode ser.
Pela esquerda, porém, há Vinicius Júnior, que está muito bem no Real Madrid nessa posição...
Claro que esse é o problema para Tite, mas continuo convencido de que a melhor posição para Neymar é na ponta esquerda, mais próximo do gol. É aí que ele realmente pode fazer a diferença.

Mas Neymar parece ter aproveitado a preparação para chegar à Copa na melhor forma possível.
Vamos ver se ele aprendeu com as experiências anteriores, e este pode ser o momento certo. Tenho certeza de que um jogador como ele merece ganhar a Copa do Mundo, mas ainda não provou ser um fenômeno absoluto com a Seleção.
Em termos de potencial, Neymar está no nível de Messi?
Eles têm um tipo de jogo diferente. Messi não tem as qualidades de Neymar, mas é muito mais objetivo, e sabe o que precisa fazer. Messi quase nunca perde uma bola, enquanto Neymar às vezes perde por aquele toque a mais, o que não é bom.
Muitos dizem que o Brasil é o favorito...
Não concordo muito. Na minha opinião, os europeus têm sempre algo mais em termos de organização. Espanha, Alemanha, França, todas elas são seleções que competem sempre. Mas a Bélgica e a Croácia também não devem ser subestimadas.
Com essas declarações, parece que a estreia contra a Sérvia te assusta.
Também não vamos exagerar (risos). O Brasil é um time forte e tem de passar em primeiro no seu grupo. E a Sérvia e a Suíça são duas equipes sólidas que se têm saído bem. Digamos que será um bom teste. Mas se (o Brasil) quiser ganhar a Copa do Mundo, tem de passar por esses testes.
A qualidade da equipe é inegável. Neymar, Vini Jr., Paquetá, Richarlison... Todos eles são jogadores talentosos.
Sim, mas acho que falta algo em termos de mentalidade. As pessoas aplaudem e vão aplaudir, à espera de uma vitória, mas não vejo confiança no ar. Lembro muito da Copa de 2014, em casa. O Brasil alcançou as semifinais com a Alemanha sem ter jogado bem um único jogo. Essa semifinal foi um desastre, uma tragédia, mas também a confirmação de que o projeto tático não era concreto.
Sonha com uma final Brasil x Argentina?
Isso seria maravilhoso (risos), embora eu ache muito difícil.
Mas em edições disputadas fora da Europa, até 2002, só seleções sul-americanas venceram.
Mas ultimamente a situação mudou, porque as últimas edições foram vencidas só pelas europeias. Veremos se desta vez um sul-americano voltará a ganhar após 20 anos.
Por último, o que pensa sobre a decisão de jogar no Catar?
Foi uma decisão tomada pela conveniência econômica. O Catar não é um país de futebol, e, para criar um cenário para a Copa do Mundo, mais de seis mil pessoas morreram na construção dos estádios. Não concordo nem um pouco com essa decisão, e acho que não haverá a mesma atmosfera pacífica que vimos em outras Copas do Mundo, quando todos podiam ir e aplaudir livremente.
Mas o seu coração vai estar com o Brasil?
Claro! Não há dúvida sobre isso (risos).