"A importância que Juve e Inter estão dando a esta competição é basicamente guiada pelo dinheiro", afirmou Antonio Moschella, editor do Flashscore na Itália.
O que dizem os editores gringos do Flashscore sobre o interesse europeu no Mundial?
Perguntamos a todos nossos colegar jornalistas envolvidos com a Copa do Mundo de Clubes, e todo mundo é unânime: não existe no Velho Continente o hype que existe na América do Sul. Entenda a seguir por que isso acontece e qual a razão do incômodo dos brasileiros.

Um "problema" antigo
Como já contamos aqui no Flashscore, a história do desdém europeu e da obsessão sul-americana passa pela violência argentina dos anos 70 que assustaram Ajax, Juventus e Nottingham Forest.
Outra diferença histórica é que o Mundial de Clubes sempre aconteceu no meio da temporada europeia – o que é um empecilho para eles. Hoje em dia, porém, o buraco é mais embaixo.
Em mais uma década vivendo entre Inglaterra e Alemanha, jamais vi a imprensa dar qualquer destaque para a competição, ou torcedores locais parando para assistir a qualquer partida do torneio que chamávamos de Mundial.
O cenário está mudando um pouco neste ano por conta da presença de 12 equipes europeias na Copa do Mundo de Clubes. Mas não muito: a imprensa francesa, por exemplo, levou apenas 4 jornalistas para seguir o PSG nos Estados Unidos.
Siga a Copa do Mundo de Clubes em tempo real
Quem desdenha não quer comprar
Não é (só) soberba, há uma diferença de percepção da realidade e de equilíbrio de forças. Historicamente, são os sul-americanos que vão jogar na Europa, e não o contrário; são os sul-americanos que diariamente ouvem falar dos clubes do Velho Continente, não o contrário.
Na década de 90, as principais ligas europeias passaram a ser transmitidas na América do Sul – e não o contrário.

Isto tudo por conta, sim, da diferença econômica, mas também porque quem colonizou o planeta foi a Europa. Só olhar quem está no centro do mapa mundi: nós literalmente olhamos para antigas metrópoles como o centro do globo.
Repare que a TV Globo tem correspondentes em Nova York e Londres aparecendo em seus jornais cotidianamente, e não no Cairo ou em Seul. Em contraste, quantas vezes os correspondentes da BBC e da NBC no Rio de Janeiro aparecem nos jornais do Reino Unido e dos Estados Unidos?
Temos este (péssimo?) hábito de olhar para os países dominantes com deferência. Contudo, querer ser reconhecido pelo "mais forte" é um comportamento perfeitamente normal, como explica o pesquisador comportamental Ozan Isler, da Universidade de Queensland. "Colegas moldam as percepções das normas sociais, bem como o comportamento moral individual", lembra ele.
Nesta Copa do Mundo de Clubes, os sites esportivos do Brasil publicam quase obsessivamente o que a imprensa "internacional" anda falando dos times brasileiros. Com um detalhe: o recorte "internacional" é basicamente os jornais espanhois AS e Marca, e algum site alemão.

A importância da validação do outro
É fundamental querer que o seu adversário se importe pelo jogo como você se importa – afinal, qual a graça de levar qualquer partida esportiva a sério quando seu rival não está nem aí?
É por isso que os sul-americanos se incomodam tanto com o desdém europeu ao Mundial de Clubes. O desinteresse é uma ameaça ao "contrato social" deste torneio para todos os outros participantes.

O mesmo vale para vários sistemas de crença que necessitam da coletividade: de religião (você não vai à igreja ou à mesquita junto com o amigo ateu) e horóscopo (tente argumentar cientificamente com fã de signos) até geopolítica (para um país ser reconhecido como tal, é preciso que outras nações da ONU concordem).
Sim, os clubes da Champions League já deixaram bem claro para a FIFA que não gostam do Mundial de Clubes, e isso é de fato muito brochante. Essa descrença toda invalida, atrapalha a crença dos que gostam.
Atrapalha tanto que torcedores nas redes sociais perdem a linha até com quem relata esta descrença, como aconteceu com o jornalista João Castelo Branco, da ESPN Brasil, que não achou torcedores do Chelsea se importando com o jogo contra o Flamengo.
Os latinos da Europa se importam mais
Apenas Portugal dá destaque para o Brasileirão na tevê (por conta do fuso, da proximidade cultural e dos técnicos portugueses).
Já a liga portuguesa é completamente ignorada no Brasil. Portugal é a exceção à regra: os patrícios conhecem muito mais o futebol (e também a música e a novela) brasileira, do que vice-versa.

Portugal – e também Espanha – costumam dar mais relevância ao Mundial de Clubes do que os vizinhos do norte da Europa. A imprensa destes países também ficam mais de olho no que os vizinhos falam deles do que vice-versa.
Neste ano, haverá mais interesse da mídia em todo o continente pois há duelos entre times grandes da UEFA no torneio da FIFA, somado ao fato de que a temporada europeia já acabou – e, portanto, há bastante espaço para ser preenchido nos jornais.
No entando, o desdém não sumiu. No dia da estreia do Porto na Copa do Mundo de Clubes contra o Palmeiras, o torneio da FIFA aparecia apenas no rodapé do jornal português A Bola.

Olho no espelho
Você conhece a história do Mazembe? Ou vê o Auckland City como o grande time a ser batido? Você quer saber o que os torcedores em Tunis pensam do Flamengo?
Imagine que – como querem os clubes da Champions League – os europeus deixem de jogar o Mundial. Você daria o mesmo peso ao torneio se os times do Brasil só pudessem enfrentar Tigres, Al-Ahly e afins numa decisão?
E não é por mal, gente. Assim como os brasileiros não acompanham a Liga MX, por exemplo, os ingleses não seguem o Brasileirão.
Não é porque o Brasil vê o México com desdém, mas sim porque não o enxerga como um grande adversário, e porque Messi, Mbappé e etc. não jogam por lá.

E lembre-se: os brasileiros não davam a muita importância para a Libertadores até a década de 1980. Lembre-se também da empáfia de alguns times do Brasil em relação à Copa Sul-Americana.
Outro detalhe: se na América do Sul a Liga dos Campeões é transmitida por inúmeros canais no meio da tarde, a Libertadores passa (quando passa) em algum streaming obscuro da Inglaterra às 2h30 da manhã. Não dá para esperar que um torcedor do Manchester United fique acordado de madrugada para assistir Palmeiras x Deportivo Pereira.
Perguntei para um fanático torcedor inglês do Liverpool – que viveu no Brasil por anos – como ele descreveria o Mundial de Clubes.
"Amistoso glorificado", respondeu Sam, acrescentando que "foi até legal para o Liverpool finalmente vencer o título (contra o Flamengo, em 2019)". E este cara tem até camisa do ABC de Natal.
Jonas, torcedor do Bayern, comentou que "o torneio até poderia ser legal, mas não tem tradição, e somos muito eurocêntricos para aceitar imposições da FIFA".
Por conta da rivalidade e do desafio esportivo, o ápice para os ingleses é vencer a Champions.
Repare que não é só pela fascinação, mas também pelo desafio gigante que no Brasil damos foco para o possível encontro entre brasileiros e o time europeu no torneio da FIFA.
Só que a recíproca não é verdadeira.

Se você acha que o torneio da FIFA é mais importante para o seu clube que o torneio continental, não tem problema. Mas não há como esperar que os europeus, com seus costumes e prioridades, façam o mesmo – e isso não invalida seu sentimento.
A nova Copa de Clubes da FIFA agora acontece no verão deles, quando as pessoas estão de férias, curtem a vida ao ar livre e só param para ver dois torneios de futebol: a Euro e a Copa do Mundo. Problema deles. Quanto menos obsessão com que os europeus pensam, mais escapamos do eurocentrismo – e menos vira-lata é nosso complexo.
_______________________________________________
Patrocinado:
Copa do Mundo de Clubes da FIFA - Todos os jogos de graça, exclusivamente no DAZN
_______________________________________________
