Diego Costa chegou chegando no Krasnodar no meio de 2024, não demorando a convencer o treinador de sua qualidade. As dificuldades iniciais dentro e fora de campo, para se acostumar com uma liga bastante diferente da que estava acostumado, assim como o frio e a língua, logo foram superadas.
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Uma estratégia de Diego que deu certo foi instalar uma academia de ginástica do lado de fora de sua casa, acelerando o processo de adaptação ao temido frio russo. O jogador trouxe sorte ao clube, conquistando o inédito e histórico título nacional logo na primeira temporada, com o Krasnodar recebendo outros olhares dos adversários na atual temporada, onde defende o título e faz por onde para brigar pelas primeiras posições.

Nesta entrevista exclusiva ao Flashscore, o jogador fala dos tempos de São Paulo, de Rogério Ceni e do que tem feito a diferença para ter se firmado no Krasnodar em tão pouco tempo, algo que muitos não conseguem mesmo depois de um longo período no futebol russo.
Como surgiu a ideia de montar uma academia do lado de fora da sua casa assim que chegou à Rússia?
Alguns jogadores não têm essa opção porque já chegam em uma casa ou prédio com academia interna. No meu caso, eu precisei montar uma academia e decidi que ela ficasse do lado de fora.
Quando cheguei aqui na Rússia, fiquei bastante assustado com o frio. Eu já ia montar uma academia e preferi que ela ficasse na parte de fora, para já ir me acostumando. As temperaturas caem bastante e todo mundo falava que, por conta do frio, o jogo poderia ficar um pouco mais complicado. Então já montei a academia do lado de fora para acostumar meu corpo.
Essa exposição gradativa ao frio me ajudou bastante na adaptação, me acostumei mais rápido às baixas temperaturas e sofri menos. Achei que ia sofrer mais, cheguei a jogar com sensação térmica de -12, então ter montado a academia do lado de fora foi bem importante.

Você chegou ao São Paulo com 15 anos. Onde você jogou antes disso?
Eu nasci em Campo Grande (MS). Joguei em vários times da minha cidade e do meu estado. Com 13 anos, fui para o Rio Grande do Sul, passei em alguns times da Serra Gaúcha e, depois de um ano e meio, voltei para Campo Grande, sem perspectiva nenhuma.
Fiz uma avaliação no centro de treinamento de São Paulo, que se chamava CTR e passei. De lá, fui para o Grêmio Prudente, joguei o Paulista sub-17 e logo depois a Copa São Paulo, quando fui vendido para o São Paulo. Cheguei lá com 15 anos e fiquei lá até os 24.
Como foi sua adaptação ao São Paulo?
Cheguei lá para jogar no sub-16, foi um ano bem difícil de adaptação para mim. Cheguei em uma das melhores categorias de base do Brasil, então até pegar o ritmo dos outros atletas foi um pouco complicado. A estrutura era bem melhor e os jogadores mais bem preparados.
Ali, eu jogava de zagueiro e volante, fui virar zagueiro fixo somente no sub-17. Aquele ano foi importante para ganhar massa muscular, comecei a me alimentar melhor, treinava mais e tinha grandes profissionais à disposição. Existia uma certa distância para os outros atletas. Nesta época do sub-16, eu jogava muitos amistosos. Cheguei lá jogando como zagueiro mas também atuava como volante.
Fui me adaptando bem e, logo no ano seguinte, no sub-17, já passei a jogar e ser capitão também. O técnico Orlando Ribeiro me ajudou bastante, inclusive quando estive no sub-20. Fiz uma base muito vitoriosa no São Paulo.

O que você pode dizer deste período no São Paulo, do significado do clube para você?
Sou muito grato ao clube por tudo que eu vivi lá. Desde quando cheguei no São Paulo, fui muito bem respaldado. O clube mudou o meu nível de futebol, minha carreira, mudou a vida da minha família também. Sempre tive uma relação muito boa com o torcedor, sou agradecido aos profissionais que lá estiveram, tenho muitos amigos lá até hoje, são pessoas que me ajudaram bastante. Sou muito grato mesmo por tudo que o clube fez por mim, por tudo que conquistei, desde as categorias de base.
Como foi a decisão de deixar o São Paulo?
Não foi fácil porque eu estava lá há 10 anos, já tinha feito quase 200 jogos pelo profissional. Minha intenção era ficar no São Paulo por muito mais tempo, fazer minha carreira por lá. Mas tive uma lesão depois da final da Sul-Americana de 2022, não fiz a pré-temporada do ano seguinte. Mesmo depois de me recuperar, não me sentia bem, sabia que não estava no meu melhor nível.
Então, quando apareceu o Krasnodar, foi uma oportunidade para mim crescer, para sair do Brasil, ganhar mais minutagem e experiência. Foi bom para sair da minha zona de conforto também. Vi a transferência com bons olhos, muito por causa da estrutura e do projeto do Krasnodar. Isso pesou bastante, era um time de uma liga forte e sabia que era uma chance de amadurecer.

Quais lembranças e aprendizados você teve com o Rogério Ceni?
Antes dele chegar, eu não vinha jogando tanto. Ele é um cara que, se você se dedica, se você realmente está merecendo um lugar no time, as oportunidades vão aparecer. Quando tive as chances, me firmei no elenco, depois virei capitão. Ele é um cara muito rigoroso, muito correto.
Eu gosto do jeito que ele trabalha. Os treinos dele são os melhores, ele faz muitas correções no dia a dia, são treinos dinâmicos e todo mundo elogia. Só tenho coisas boas para falar dele, um ídolo do clube. Sempre tive um respeito por ele antes mesmo de trabalharmos juntos, por tudo que ele representa para o São Paulo. Foi com ele que virei capitão, fiz mais de 40 jogos com a braçadeira.
Você foi capitão na base também. É algo que é construído ou é preciso ter uma certa personalidade? De onde vem isso?
Acho que é algo que está comigo, mesmo nunca tendo trabalhado para ser capitão. Sempre fui muito competitivo, desde os treinos. Sou um cara que gosto muito de competir em alto nível, procuro sempre estar jogando, tento aproveitar bem todas as oportunidades.
Me acostumei a ser um dos caras que mais treinava, acho que isso ajudou. Ser capitão de um clube como o São Paulo é uma responsabilidade muito grande. Então, a partir do momento que você é capitão do clube, coisas boas aparecem, sem esquecer das cobranças. É algo que sempre esteve comigo desde a base, apesar de nunca estar focado em ser capitão. É algo que está na minha identidade, no meu jeito de ser.

Adaptação à Rússia foi mais rápida do que o esperado?
As primeiras semanas foram mais difíceis. Mas a estrutura do clube é fantástica. Eu já falava um pouco de inglês, mas eles disponibilizam tradutores em inglês, espanhol, alguns falam português. O CT é muito bom, nunca tinha visto nada parecido. O CT da base é incrível, talvez seja o maior da Rússia e acredito que está entre os melhores do mundo. Quando eu chego no clube, me deparo com este respaldo, eles me deram muita assistência, tomaram a frente de várias situações, me ajudaram em tudo.
A cidade onde vivo é mais tranquila porque ela está mais ao sul, então não faz tanto frio quanto em outros lugares. No verão aqui, eu pego 35, 38 graus. Agora começou a esfriar aqui, a neve demora mais para aparecer do que em outras cidades. Em Moscou, o frio é mais rigoroso.
Na semana seguinte à minha chegada, virei titular e não saí mais do time. Foi algo muito rápido, em dois ou três meses já parecia que eu estava aqui há anos. O time se encaixou e as coisas foram dando certo. Tivemos uma sequência grande de vitórias e as coisas realmente aconteceram muito rápido. Além disso, o clube conta com brasileiros e jogadores sul-americanos.
Você se adaptou bem ao universo do futebol russo, algo que o Gerson, ex-Flamengo, parece que ainda não conseguiu. O que você pode indicar para quem chega há pouco aí para ter uma boa adaptação e um sucesso dentro e fora dos campos?
Não tenho proximidade com o Gerson para saber os detalhes do que não tem dado certo para ele. A gente ouve falar porque estamos na mesma liga e sabemos que é um grande jogador. A Rússia é um país muito diferente, em termos de cultura, clima e língua. A questão do idioma é muito importante, falar o inglês é fundamental. Asim que comecei a ter uma vida financeira melhor, decidi investir em aprimorar o inglês, eu sabia que seria importante em algum momento. Quando cheguei na Rússia, segui estudando, fui melhorando para poder me comunicar melhor. Hoje me viro sozinho, isso me permitiu dar alguns passos à frente.
O sonho que eu tinha de jogar fora do país me moveu bastante. Quando eu cheguei aqui, estava muito determinado a trabalhar, a passar pelo que fosse necessário para jogar e me destacar. Se dependesse de mim, eu ia fazer o que fosse possível para superar as adversidades.

Ser campeão russo superou a expectativa que você e o clube tinham?
Acho que conquistar o título não estava no planejamento e no objetivo inicial. Claro que sempre vamos buscar as vitórias, mas sabíamos da tradição de outros clubes, como CSKA Moscou, Dínamo de Moscou, Lokomotiv, Zenit...
O Krasnodar não era o grande favorito ao título, mas já tinha brigado pelos primeiros lugares na temporada anterior à minha chegada. O time já tinha uma identidade e eu chego para agregar. Fomos campeões e superamos as expectativas
Como foi a comemoração do título?
A cidade parou, tinha gente, bandeira e faixas pra todo lado. Demoramos horas para sair do estádio no dia do título, era muita gente ao redor do ônibus comemorando. Foi bem legal estar presente neste momento histórico para a cidade e para o clube também.

O que você acha que tem feito a diferença para essa sequência de bons resultados?
A qualidade dos jogadores fala mais alto, temos muitos bons jogadores sul-americanos e russos. O elenco é muito forte e tivemos boas contratações. O investimento do clube permitiu uma grande competitividade entre os jogadores. Sabemos que temos que dar o máximo porque existem boas peças esperando por oportunidade. A concorrência dentro da equipe é crescente e o nosso time continua forte na briga pelo título. Agora que fomos campeões, os outros times nos olham de um outro jeito, estamos mais visados.
O que dizer da sua relação com o técnico Murad Musayev, de apenas 41 anos?
Desde a minha chegada, ele me recebeu super bem. Inclusive, ele me chamou para conversar particularmente, falou que não tinha problema se eu não rendesse tão bem nos nos primeiros jogos, por causa de condição física, fuso horário, etc. Ele me deu total respaldo e liberdade para jogar e me ajuda até hoje. Ele tem o estilo paizão, se você precisar conversar, trocar uma ideia, ele sempre está à disposição. Tenho muito a agradecer pelo que ele fez, pela confiança que me deu. Muitos falam que os russos são mais retraídos mas, da parte dele, eu sempre recebi muita atenção e respeito. Isso aí me ajudou bastante também.
O seu dia a dia ou do clube foi afetado, de alguma forma, pela guerra?
Muito pouco. Quando eu cheguei, o aeroporto de Krasnodar estava fechado, mas voltou a abrir depois de uns dois meses. A localização da cidade é muito boa, com duas horas de voo estamos em qualquer lugar do país.

O Krasnodar conta com os brasileiros Jubal, Gustavo Furtado, Douglas Augusto, Vitor Sá, Tormena, além de um colombiano e dois uruguaios. Fora de campo, vocês costumam passar mais tempo juntos, existe essa proximidade entre os sul-americanos?
Sim, mas os russos também conseguem participar dos momentos de folga. O sucesso pra ser campeão foi essa união, estamos sempre juntos. Quando temos dias livres, nos reunimos, fazemos almoços e churracos, saímos juntos para restaurantes. Esa fusão dos estrangeiros aqui na Rússia foi muito boa.
Todos falam inglês e recebem os novatos bem, era algo que eu não esperava, achei que seria muito mais difícil do que foi. Com pouco tempo, já estava bem adaptado ao clube, ao clima, à cultura, aos jogadores russos. Então, foi bem tranquilo.
Na última temporada você fez 32 jogos e recebeu sete cartões amarelos, uma média de um cartão a cada 4,5 jogos. O que dizer sobre o tipo de jogo que você encontrou na Rússia?
Quando eu chego aqui na Rússia, me deparo com um jogo muito físico e rápido. Mesmo com os jogadores não tendo a mesma qualidade de um brasileiro ou sul-americano, o nível é elevado em termos de intensidade e força física. Nos meus primeiros meses, senti bastante essa diferença. Toda hora era duelo direto, até pela nossa forma de jogar, era pressão o jogo inteiro. Então eu ficava em situações de enfrentamento direto com atacantes o tempo todo, a exposição era inevitável e isso talvez fez com que eu tivesse essa média de cartões.
Agora já me acostumei melhor com o jogo e a liga e sinto uma evolução nesse nesse quesito. Mas é aquilo, né? Sou zagueiro e precisamos defender o máximo possível. Quando se joga no mano a mano, se eu tomar um drible ou algo do tipo, eu estou mais exposto e vou precisar fazer uma falta. Agora, já adaptado, me sinto muito mais confiante.
Você consegue resumir um pouco do aprendizado que você teve na parte tática e técnica na Rússia? É muito diferente do Brasil?
O primeiro ponto foi na parte física. Minha condição física melhorou absurdamente, eu me sinto um jogador muito mais rápido e forte. Meu jogo aéreo, que eu já considerava positivo, aumentou muito. Aqui tem uma estrutura boa para esse aperfeiçoamento físico, com médico, nutricionista, uma academia fora de série. Existe um treinador na academia só para trabalhar força, um outro somente focado na parte de campo, outro para jogadas de bola parada, o que me ajuda muito também, já que trabalhamos muitas jogadas ensaiadas. Essa minha evolução vem muito do respaldo que o clube me dá.
Trabalhei bastante para evoluir, é uma fusão de tudo isso que falei. Acho que estou vivendo o melhor momento da minha carreira, me sinto muito à vontade e acho que tenho muito a crescer. Estou no meu segundo ano de Rússia, bem mais acostumado, tenho tudo para brigar para ser um dos melhores defensores da liga. Esse é o meu objetivo agora.
Sentiu muita diferença de calendário?
Sim, aqui são menos jogos. A logística é muito melhor também. No Brasil, os jogadores sofrem muito com o calendário, é algo sobrenatural. Aqui na Rússia é bem diferente, jogamos no máximo duas vezes na semana.
Como as distâncias são menores, conseguimos descansar mais, sem precisar jogar três vezes na outra semana, é bem mais tranquilo, nem se compara.
Aí na Rússia existe muito gramado artificial?
Se não me engano, só um clube joga neste tipo de gramado. Todos os outros gramados são muito bons, muito mesmo. Se você perguntar para qualquer jogador, ele vai preferir a grama natural, mas não podemos nos dar ao luxo de escolher. Eu tento me adaptar o mais rápido possível, na base do São Paulo a gente treinava muito em grama artificial. Mas jogar em gramado artificial não chega a ser um problema.
Você pensa no pós-carreira?
Já tenho algumas empresas, mas não sei exatamente o que eu vou fazer, se vou seguir no futebol, se vou para o ramo empresarial, acho que tem muito tempo ainda para definir. Tento viver o dia após dia, desfrutar do melhor que estou vivendo nesse momento. Estou muito feliz e acho que eu posso decidir sobre meu pós carreira mais para frente.