Em entrevista exclusiva ao Flashscore, Magrão lembra do início do Sport, quando assinou um contrato de apena sete meses, sem imaginar no período de mais de uma década que ficaria no clube. Aposentado desde 2019, ele aproveita a boa vida no Velho Mundo, sabendo usufruir da renda que guardou e dos investimentos que fez para acompanhar, de longe, o retorno do Leão à elite do futebol brasileiro depois de três anos.
Ele também fala sobre ter sofrido o gol 1000 de Romário, da tentativa de entrar na vida política e como a Seleção Brasileira poderia ter feito parte da sua vida se tivesse tido o mesmo desempenho, mas por um clube do Sul ou Sudeste, com a questão regional interferindo para sua não convocação.
Confira abaixo a entrevista exclusiva com Magrão:
Conseguiu acompanhar a campanha que fez o Sport retornar à elite do futebol brasileiro?
Não muito, estou na Europa com algumas horas à frente. Quando os jogos eram mais cedo, consegui ver alguns. Contra o Santos, jogo que confirmou o acesso, vi algumas lances e fiquei muito feliz com o retorno do time ao Brasileirão.
O que dizer do trabalho do técnico Pepa à frente do Sport?
Pra mim, foi uma grande surpresa ele ter pego o Sport na situação em que o clube se encontrava, com o time caindo de produção e correndo sério risco de não subir. É difícil um técnico aceitar este desafio, ele foi muito corajoso. Ele conseguiu recolocar o Sport nos trilhos, fez um grande trabalho.
Nesta situação, não é fácil dar uma reviravolta, ele tem grande parcela de contribuição no acesso, fez um grande trabalho. Fico feliz com a renovação de contrato para 2025, sem dúvida ele foi uma das peças mais importantes neste acesso. A chegada dele transformou o time, ele foi fundamental para a volta do Sport ao Brasileirão. Espero que ele possa dar sequência e ter um grande 2025.
Onde você mora atualmente?
Estou há cinco anos na Itália. Neste momento, estou passeando com a família pela Escócia e Inglaterra. Eu me programei durante seis anos para fazer esta mudança na minha vida. A Itália era um destino frequente das férias e sempre tive a vontade de morar neste país. A adaptação foi boa e hoje estou afastado do futebol. Vivo do que conquistei, da minha renda guardada e de investimentos feitos.
Você jogou em vários times antes de chegar ao Sport, certo?
Sim, foi somente no Sport que me firmei e tive sequência. Fiquei 14 anos por lá, criei uma grande identificação e pude retribuir todo o carinho e gratidão recebidos. Foi onde encontrei a melhor fase da minha carreira.
O que teve de diferente no Sport?
Ali eu fiquei bom de bola (rs). Cada jogador tem um tempo e local de amadurecimento, ali foi o meu. Goleiro, normalmente, fica mais maduro a partir dos 27 anos, é difícil você se firmar em um clube com pouca idade. Cheguei um pouco mais velho no Sport e foi um casamento perfeito. A torcida era exigente, as coisas aconteceram naturalmente, apesar de ter muita pressão. Conquistar títulos foi fundamental para ficar tanto tempo por lá.
Momentos turbulentos foram inevitáveis, imagino...
Com certeza, no futebol não há como passar somente por boas fases. Como em qualquer clube, o Sport teve altos e baixos, passei por elogios e críticas. O início foi difícil, não era conhecido e tive dificuldade para me firmar. Convivi com críticas da torcida e da imprensa, isso só me fez crescer. Com os anos, consegui me firmar como titular, dei conta do recado e participei de um bom período de títulos e vitórias. Muitas cobranças aconteceram, mas sempre olhei e segui em frente.
Os altos e baixos fizeram eu conviver com muitos treinadores, foram várias trocas por lá. Quando se muda, é porque não está dando certo, mas a paciência foi pouca, como acontece normalmente no futebol brasileiro. Somos muito imediatistas, não se tem tempo para trabalhar e fazer surtir algum efeito. Quando o resultado não aparece, sobra para o técnico e vi isso muito de perto, várias vezes, no Sport.
Os títulos foram fundamentais para você colocar seu nome na história do clube?
Certamente, o que marca são as taças levantadas. Você pode ser bom, mas só fica na história de um clube com títulos, isso o coloca num outro patamar. Foram 10 títulos em 14 anos de Sport.
Teve algum ponto de virada na sua passagem pelo Sport?
Foi em 2007, no Brasileirão. Eu tinha chegado em 2005 e oscilei entre titular e reserva até 2006. Foi somente com o Geninho que me firmei, ali as dúvidas acabaram e meu papel começou a ser outro.
Você imaginava ficar tanto tempo no Sport depois de assinar um contrato de apenas sete meses?
De forma alguma. Cheguei em abril, com vínculo até o final do ano. Vinha de passagem por vários clubes e buscava me consolidar, pensando também no bem-estar da família. As coisas aconteceram e fui feliz por ter ficado tanto tempo no Leão.
Você sofreu o gol 1000 de Romário. Quais as lembranças que têm daquele dia?
Gosto de ser lembrado por isso, não me incomodo. Claro que não queria sofrer aquele gol, mas não houve demérito nenhum. Foi um momento marcante pra ele e pra mim.
Eu já imaginava que poderia sofrer o gol 1000 dele nas rodadas anteriores. Acompanhava os jogos e nada dele marcar, com o jogo contra o Sport se aproximando. Eu sabia que ia sobrar pra mim (rs). O Vasco estava jogando no Maracanã e decidiram mudar o jogo contra o Sport para São Januário. Ali eu vi que não ia ter escapatória.
Na véspera do jogo, liguei pro meu pai como sempre fazia e ele me alertou que tinha boas chances de um pênalti ser marcado para o Vasco. Eu sabia dessa chance real. Meu pai me alertou que o Romário batia sempre no canto direito do goleiro, eu falei que era no esquerdo. Resolvei ir na sugestão dele na hora da cobrança e me dei mal.
Você ficou conhecido por ser um grande pegador de pênaltis. Qual o segredo?
Em boa parte da minha carreira, não existia ainda a função do analista de desempenho. Quando eu comecei a ter contato com este profissional, recebi grande ajuda.
Até então, o treinador dava algumas dicas, mas eu buscava sempre observar a posição do cobrador, como ele batia as faltas e escanteios, além de tirar proveito da minha intuição no momento. Depois de 2007, emplaquei uma sequência de mais de 30 pênaltis defendidos. Se não fosse pelo meu pai, este número seria maior (rs).
A cera que muitos goleiros do futebol brasileiro fazem te incomoda?
Demais! Acho muto feio, na minha época já tinha isso, mas hoje está demais. Peguei um treinador no Ceará que me pedia pra fazer cera e eu fui contra. Hoje estão exagerando para ganhar tempo.
O Magrão chegaria à Seleção se tivesse tido aquela boa fase do Sport mas em um time do Sul ou Sudeste?
Não tenho dúvidas. Jogadores de times do Sul e Sudeste fazem quatro bons jogos e já são chamados. Jogadores do Nordeste, até hoje, precisam fazer uma temporada perfeita para serem lembrados.
Você tentou se enveredar pela política mas não deu muito certo. O que aconteceu?
Vi muitas coisas desagradáveis. Estava propenso a entrar para aquele mundo. Tive um segundo convite, mas preferi seguir no futebol.
Não demorei a perceber que aquilo não era pra mim. Eu mal havia chegado e já foram me falando que deveria dar metade dos cargos disponíveis para pessoas que nem eram capacitadas, não quis fazer parte daquele tipo de jogo antes mesmo de entrar na política.
É algo que também acontece no futebol e me desanimou a me tornar dirigente ou assumir outro cargo. Quando você é jogador, você engole as coisas. Mas, como dirigente, eu não aceitaria participar destas artimanhas de bastidores.
Existe um meme com seu nome que até hoje é lembrado, de um torcedor provocando o goleiro Saulo, reserva do Sport, o chamando de reserva de Magrão. Lembra disso?
Claro, não tem como esquecer. Foi em um jogo contra o Petrolina, o alambrado era muito perto do campo. O torcedor era muito chato, provocava e xingava cada um, mas preciso admitir que ele também foi muito criativo. Era aquele torcedor raiz. Não guardo mágoa disso, eu acho é graça até hoje.
